quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Massificação Cultural, Globalização e Pokémon GO


O mundo “globalizado” criou na sociedade contemporânea uma grande contradição. A revolução técnico-científico-informacional colocou nas mãos do ser humano meios de comunicação e transportes que facilitam cada vez mais o contato entre os humanos e as coisas criadas por eles. Mas infelizmente nem sempre é o que acontece, temos uma tendência cada vez maior de solidão e desculturalização.

O maior instrumento da globalização cultural na sociedade tecnológica tem sido certamente a expansão das redes de comunicação de massa. A abrangência, extensão e eficácia dessas redes estão na raiz das grandes transformações ocorridas na virada do século XX. A redução do planeta a uma aldeia produziu uma verdadeira revolução espaço-temporal. Esse pensamento é bastante conhecido pela obra de Harvey que bem antes da internet viralizar já escrevia sobre isso em 1989.

O convívio humano que resulta de contatos primários é a característica dominante das sociedades pouco industrializadas, das zonas rurais ou de pequenos grupos sociais. A industrialização e a urbanização estabeleceram um modo de vida no qual o contato primário, interpessoal, foi reduzido, favorecendo a generalização dos contatos secundários e das relações impessoais.

Observa-se, assim, uma tendência inversa entre a formação de grandes aglomerados populacionais e o convívio humano. A instauração da sociedade de consumo e da sociedade de massa para o surgimento de um ser humano massificado.

O ser humano, nesse modelo social, deixa de ser considerado pessoa e passa a ser encarado como máquina devoradora de produtos, ideias ou mercadorias. Não se consideram valores pessoais ou anseios individuais. Por um processo de condicionamento gradual irreversível, vão sendo terminados seus anseios, de acordo com as necessidades de reprodução do sistema. Sua personalidade vai se transformando e seu comportamento se adaptando no sentido de atender aos objetivos dessa nova ordem. O ser humano deixa de ser um indivíduo e passa a ser apenas uma entidade numérica, parte de uma grande engrenagem, da qual é um simples objeto.

A complexidade urbana, a generalização do anonimato, o surgimento da selva de pedra e a massificação de alguns dos fatores que contribuem para a despersonalização dos indivíduos. Na sociedade pós-industrial, o contato em geral entre as pessoas é apenas físico; o significado das interações sociais fica reduzido a seus papéis sociais formais e suas funções profissionais. À medida que os contatos meramente formais se generalizam, expande-se o anonimato. Conforme afirma Delfim Soares.

“O homem vive no meio da multidão, mas não convive com ninguém, como pessoa; a multidão nas ruas, o congestionamento no trânsito, a moradia em apartamentos superpostos, as turbas nos estádios esportivos e os enxames humanos nas praias são manifestações sociais frequentes. Nelas, raramente se verifica convívio humano; mesmo as relações mais íntimas são, muitas vezes, mero contato de objetos humanos e não relações interpessoais. Os indivíduos não se encaram mais como pessoas, mas como objetos. Nesse contexto, cresce a sensação de solidão.”

Diante desse mundo massificado e cada vez mais homogêneo e isolado, vejo no Pokémon Go um novo passo sutil ao remodelamento social. Vivemos cada vez mais em um mundo virtual cada um dentro de sua casa onde nossos computadores e smartphones se transformam em um mundo paralelo.

O Pokémon Go pode nem durar muito tempo, mas já fez muita gente tirar a bunda do sofá e ir pra rua, ver pessoas reais. Assim ao menos eu enxergo. Mas deixo minhas palavras de lado e segue abaixo um vídeo do menino Adam feito pela BBC explicar melhor.


Tenho certeza que não foi só a vida de Adam que mudou e tenho certeza de que muitas novidades do gênero ainda vão surgir e fazer as pessoas saírem de casa!

Voltando ao contexto da massificação da cultura, deixo abaixo uma entrevista do famoso fotógrafo Sebastião Salgado à Paula Diniz (National Geographic) que percorreu o mundo buscando mostrar o que ele tem de DIFERENTE!

Jonathan Kreutzfeld

ENTREVISTA


Perto de completar 70 anos - 40 deles dedicados à fotografia -, Sebastião Salgado mantém o encantamento ao falar das experiências vividas durante a produção de Gênesis, seu mais recente projeto. Entre 2004 e 2011, ele visitou cinco continentes, em mais de 30 viagens para regiões quase sempre inóspitas, como Sibéria, Galápagos e Papua Nova Guiné. Pela primeira vez, Salgado documentou, como frisa, "outros animais além do homem". Retratou paisagens, fauna, flora e comunidades humanas que ainda vivem dentro de suas tradições ancestrais, imunes às transformações impostas pelo modo de vida contemporâneo.

Como foi a experiência de fazer Gênesis?

Com dois anos de preparação, oito de fotografia e mais dois de pós-produção, passei grande parte da minha vida dentro desse projeto. Foram, em média, oito meses por ano viajando, naquele que talvez possa considerar o período mais rico da minha carreira. Gênesis fecha um ciclo com os projetos que fiz antes, sobre as guerras na África, trabalhadores e refugiados. Agora, tive a chance de conhecer locais fabulosos e aprender a respeito da minha relação com o planeta e com outros seres humanos. Convivi com grupos que representam o que fomos 10 mil anos atrás. Fui bem recebido. O homem é um ser gregário por natureza. Minha impressão é que a agressividade surgiu depois de certa organização espacial.

Como foi a sua relação com os povos retratados?

Quando você passa um tempo com as pessoas e elas compreendem o seu trabalho, que você deseja mostrar a dignidade, a personalidade delas, a maneira como vivem, elas têm orgulho de participar. Os nenets, do norte da Sibéria, por exemplo. Eles montam e desmontam suas casas todos os dias. À noite a gente comia junto, discutia junto questões cotidianas. Se eles matam uma rena, também tomam o sangue, e sempre aparece alguém com uma garrafa de vodca. É como uma família.

Aprendi com eles algo que nós perdemos na nossa sociedade: o conceito de essencial. Temos uma quantidade enorme de coisas. Compramos, acumulamos e não usamos. Se você der aos nenets um presente que eles não possam transportar no trenó, eles não aceitam. Eles possuem apenas o necessário para subsistir em uma condição climática extrema e são tão felizes quanto uma pessoa que vive em um grande apartamento em São Paulo.

O que perdemos com a massificação global dos modos de vida?

Quando eu era menino, o Brasil tinha 90% de população rural. Hoje, 90% da população é urbana. Por outro lado, na Amazônia brasileira, restam povos ainda não contatados, que vivem como há 10 mil anos. São uma referência viva do nosso passado ancestral.

Exemplos desse tipo de contradição não faltam. A Índia acabou de lançar um automóvel de 2 mil dólares. Todo mundo vai comprar. Está todo mundo felicíssimo porque vai ter um carro, mas será que esse modelo consumista ocidental é o melhor para a Índia? Nossa espécie é nova, mas tomou conta do planeta. Escravizamos as outras espécies. Se tivéssemos a capacidade de enxergar a vida como uma evolução de dezenas de milhares de anos, compreenderíamos a nossa origem e o nosso lugar, até concluir algo simples e importante: somos natureza.

O que você diria aos jovens documentaristas brasileiros?

Que fotografem mais os nossos grupos indígenas. No início da história escrita da humanidade, na antiga civilização egípcia, pessoas já habitavam a Floresta Amazônica. Temos a obrigação de conhecer e proteger esse legado cultural e ambiental.
 
Qual a missão da fotografia?

As duas únicas linguagens que não necessitam de tradução são a fotografia e a música. E a fotografia é, possivelmente, a linguagem mais acessível e universal que possa existir.


Fonte:




Nenhum comentário:

Postar um comentário