Índia
A
economia indiana também vem apresentando, nas últimas décadas,
notável
desempenho macroeconômico, caracterizado por elevadas taxas de crescimento do
PIB (média de 5,7% nos anos 1990 e de 6,3% entre 2000 e 2005), baixa inflação e
crescimento expressivo das exportações de bens e serviços, especialmente de
serviços relacionados à tecnologia da informação.
O
desempenho econômico indiano encontra-se, por vezes, associado às reformas
implementadas na Índia no início da década de 1990, com ênfase na liberalização
comercial, na abertura ao investimento direto estrangeiro, na modernização do
sistema financeiro e na redução dos monopólios do setor público. Entretanto,
DeLong (2003), Rodrik e Subramanian (2004), Kochhar et al. (2006) e Nassif
(2006) apontam que a transição para o alto crescimento teria se iniciado já em
meados dos anos 1980, uma década antes das medidas de liberalização econômica.
Tais autores argumentam que a base do crescimento indiano fundamenta-se no
período 1985-1990, no qual, para romper com um cenário protecionista de uma
indústria ineficiente e com baixa competitividade no mercado internacional,
diversas medidas foram adotadas pelo governo Rajiv Ghandi para estimular as
vendas externas: eliminação gradual dos licenciamentos
industriais
e das licenças de importação, incentivos às exportações, redução dos direitos
de monopólio do governo na importação de itens estratégicos, minirreforma
tributária, com dedução ou isenção de impostos sobre o valor adicionado dos
insumos produzidos no mercado interno ou importados.
Para
Nassif (2006), o desempenho notável da economia indiana pode ser considerado
como resultado da combinação de três fatores: i) continuidade das reformas
estruturais iniciadas nos anos 1980 para propiciar o aumento da produtividade
na economia; ii) política macroeconômica voltada ao crescimento e à geração de
empregos; e iii) uma visão estratégica de longo prazo, que mantém o planejamento
e a presença do Estado em setores economicamente pouco atrativos à livre
iniciativa.
Nesse
contexto, o processo de liberalização da economia ganhou continuidade nos anos
1990 através da adoção de medidas como a extinção dos controles de
licenciamento industrial; a quase completa eliminação dos licenciamentos para
as importações; maxidesvalorização nominal em relação ao dólar e a criação de
um mercado dual de câmbio para manter a competitividade externa dos bens e serviços
indianos comercializáveis; privatização das empresas
públicas
menos relevantes; liberalização do IDE, mas adoção de medidas mais prudentes
quanto à eliminação dos entraves à entrada de capitais de curto prazo; reforma
do sistema financeiro e do mercado de capitais, com desregulamentação bancária,
simplificação dos mecanismos de determinação das taxas de juros domésticas;
eliminação de restrições à emissão de ações no mercado primário e permissão
(sujeita a restrições) para que investidores institucionais estrangeiros pudessem
aplicar em ações de companhias indianas.
O
autor, no entanto, destaca que a estratégia indiana para o crescimento envolveu
a atuação estatal em questões que abarcam um conjunto de políticas mais amplas,
como a industrial, a comercial, a de infraestrutura, a tecnológica, a educacional
etc., em uma visão de desenvolvimento de longo prazo, onde o Estado continua
atuando em setores estratégicos, notadamente em infraestrutura. Além desses
mecanismos de liberalização e de incentivos às vendas externas, Nassif (2006)
sugere que a expansão dos déficits fiscais decorrentes das políticas de expansão
de gastos públicos pode ter contribuído para elevar as taxas médias de crescimento
econômico, porém a geração de déficits fiscais futuros acabou por ter impactos
desfavoráveis sobre o crescimento.
Velasco
(2005) ressalta o caráter pragmático assumido pelas reformas implementadas na
Índia, já que as mesmas foram realizadas de forma gradual, flexível e de acordo
com os interesses do país. Apesar de expressiva redução, a Índia mantém altos
níveis de proteção tarifária, comparativamente, e as barreiras não tarifárias
continuam a valer para a importação de bens de consumo e produtos
agrícolas.
Além disso, as reformas indianas destacam-se pelo descompromisso com fórmulas
pré-fabricadas – a Índia não defende a independência do Banco Central; não há
eliminação total dos controles de capitais; permanece a forte participação estatal
no setor bancário; e, ao invés de grandes programas de privatização, o Estado
procurou reestruturar o setor produtivo estatal mediante uma política cautelosa
de desinvestimento (venda de participações, sem transferência de controle sobre
as empresas).
Bosworth
et al. (2007) destacam que o desempenho da economia indiana, de maneira
distinta em relação à economia chinesa, se fundamenta na rápida expansão do
setor de serviços. A participação desse setor na composição do valor adicionado
total avançou consideravelmente nas últimas décadas, representando 58% do PIB
em 2003. Esse fato contribuiu para a expansão do setor de serviços,
especialmente
de tecnologia de informação, e para uma política industrial destinada a
fomentar a eficiência por meio da liberalização das importações de equipamentos.
Sobre
a taxa de acumulação de capital fixo, os autores indicam uma tendência de
crescimento da taxa de investimento (17% do PIB entre 1999-2004), sendo que a
taxa de poupança requerida para financiar o investimento na economia também tem
aumentado rapidamente. Destaca-se que a economia indiana vem tentando capturar
poupança externa, através do IDE, mas o país tem recebido muito pouco dos
fluxos de IDE direcionados para os países emergentes. Quanto à formação de
capital humano, verifica-se que a Índia ainda enfrenta sérios desafios no
sistema educacional, principalmente no que diz respeito à educação primária.
As
taxas de analfabetismo no país permanecem bastante elevadas (40%), com porcentagem
de trabalhadores com educação secundária e nível superior igual a 14% e 6%,
respectivamente, em 2004.
De
Paula e Ferrari Filho (2006) destacam o aumento do fluxo de IDE para a Índia
após os anos 1990, embora este ainda permaneça relativamente baixo. As regulamentações
sobre os fluxos de capitais de longo prazo têm sido afrouxadas, incluindo os
limites de propriedade acionária no IDE e os limites para captação de empréstimo
externo pelas firmas domésticas. As restrições sobre capitais de curto prazo
continuam, no entanto, significativas, predominando controles quantitativos e
sobre a saída de capital.
Finalizando,
Nassif (2006) observa que não há evidências precisas de que o atual processo de
crescimento da economia indiana será sustentável no longo prazo. Dependerá,
sobretudo, da capacidade do setor de serviços e industrial de produzir maiores
efeitos de encadeamento entre si e com a agricultura, que ainda absorve cerca
de 60% da força de trabalho, de forma que venham a aumentar o potencial de
absorção da força de trabalho excedente no país.
[1] Professor do
Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Pesquisador
do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e
Fapemig (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais). Pós-Doutor –
Bolsa Capes (University of Glasgow, UK).
[2] Professora do
Instituto de Economia da UFU. Doutoranda em Economia (IE-UFU), Uberlândia, MG, Brasil.
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